Mães na luta pela diversidade
- Luana Farias
- 5 de jul. de 2019
- 4 min de leitura
Atualizado: 10 de jul. de 2019
Professora de libras, e nas horas vagas uma super mãe. Priscila, 38, é integrante da ONG “Mães pela Diversidade” e trava uma luta junto com seu filho transexual de 16 anos.

Luana Farias: Como é ser mãe de uma pessoa transexual, em país que mais mata pessoas trans?
Priscila Karin: A maior dificuldade de ser mãe de trans no Brasil é a questão política e social que vivemos. É um medo constante, medo da sociedade, medo na escola, medo de sofrer algum abuso, além do desrespeito. Não dá para ficar sossegada. Não deixo ele sair sozinho a noite. Então sempre saímos em família. Quando ele atrasa para chegar em casa eu já fico preocupada, já estou ligando. Nós mães sempre ficamos na defensiva, mas sabemos que eles precisam aprender a se defender sozinhos. E eu sempre digo a ele que ele vai ser assim a vida toda, ele vai ter que aprender a se virar com situações adversas e terá sempre meu apoio.
LF: Como foi saber que seu filho é transexual?
PK: O saber foi mais tranquilo. Saber que ele é um menino transexual não foi a pior coisa do mundo. No início eu achava que era uma menina lésbica, e ele tinha acabado de completar 12 anos quando soubemos dessa questão de tranxesualidade. Assistimos uma reportagem sobre e foi quando a questionei, e ela afirmou que era transexual. A partir daí mudamos o guarda roupa, ele foi feliz da vida comprar sua primeira cueca. O mais difícil para mim foi chamar de outro nome, senão o do registro. Nos primeiros dias foram mais difíceis, depois foi ficando mais fácil.
LF: Como descobriu a ONG “Mães pela Diversidade”?
PK: Foi um achado, quando eu soube de meu filho eu fui orientada pelo centro de cidadania LGBT e lá eles me indicaram um grupo de pais de homossexuais da USP. Quando eu expliquei a situação para Doutora ela percebeu que eu não precisaria dessa terapia em grupo, porque eu já tinha aceito a situação. E o foco era ajudar pais que ainda não aceitavam. Foi aí que ela me indicou a Mães pela Diversidade, um grupo mais ativista. A ONG me acolheu e tem feito diferença na minha vida. As mães pela Diversidade transformam vidas.
LF: Juntar-se a mais mães que compartilham da mesma luta te conforta?
PK: Não só conforta, como fortalece. Saber que tem outras mães que passam pelo mesmo que você passa é muito importante, afinal juntas somos mais fortes. Se uma mãe tem uma dúvida, ou esteja passando por alguma dificuldade em casa, a outra mãe sempre ajuda, com palavra amiga ou até mesmo um café. O objetivo da ONG é esse, é a abraçar as mães que chegam, para que essas acolham outras e a gente possa estar mais presente e cada vez em mais espaços, e em todos os lugares. Embora não estejamos juntas como gostaria, sempre que podemos e que necessário estamos pertinho.
LF: A possível criminalização da homofobia resolve?
PK: Não resolve, mas é um grande passo. Bem como a criminalização do preconceito racial. Enquanto a situação é tida como normal, ela é banalizada. Então, a partir do momento que você criminaliza, as pessoas começam a repensar suas ações. Principalmente para aquelas pessoas que achavam que era brincadeira. Elas irão pensar “É tão errado que virou crime”. Embora a sociedade não acompanhe as mudanças sociais, é importante ir conscientizando aos poucos para que essa postura arcaica seja modificada, que além de errada, também mata.
LF: A “Mães pela Diversidade” acolhem a todos. Já houve relatos em que alguém pediu para ajudar a se assumir para família?
PK: Sempre tem algum relato de alguma mãe que pediu ajuda ou dos jovens que vezes pedem ajuda para conversar com a família. É muito corriqueiro isso acontecer. A gente passa confiança e esperança de que outras mães também possam aceitar, tanto que somos referência, e até mães adotivas. A mães que vão para briga e que realmente aceitam seus filhos são muito poucas. Eu dou aula de libras, e tenho duas ex alunas surdas que namoram, e no início do namoro elas sempre me pediam para ligar para o pai que era um tanto homofóbico e tentar conversar.
LF: Seu filho já sofreu qualquer tipo de violência por ser trans?
PK: Violência física ainda não. Mas emocional com certeza, principalmente em âmbito escolar de funcionários e professores, a gente imagina que os professores são mais esclarecidos, mas ainda existe muita gente preconceituosa. Só não foi pior porque ele estudava em uma classe que eu era professora, aí maneiravam, mas ainda sim já houve excessos que eu precisei me impor. E rotineiramente, as pessoas nas ruas perguntam sobre sua sexualidade, quem é trans sabe que isso sempre acontece
LF: Ele usa nome social? Qual o nome social?
PK: Sim. A princípio foi Gustavo, agora é Antoni. O registro não mudou, mas está sendo solicitado. Mas no cartão do SUS, do SPTRANS já está seu nome social
LF: O assunto transexualidade já era comum na sua vida?
PK: Não era, eu nem sabia que existia pessoas transexual. Sempre ouvimos desde criança a palavra “Travesti” mas não fiz relação de uma coisa com a outra.
LF: O que acha sobre a cirurgia de resignação?
PK: Acho um tanto invasiva, não gostaria que ele fizesse. E até onde sabemos não dá uma vida sexual de qualidade. Se fosse algo que fizesse e ficasse perfeito, tudo bem, mas não, ainda não traz efetivamente uma qualidade de vida certa. Ele pesquisa bastante e a gente até conversa sobre. A mascquetomia ele já fala de fazer, mas vamos esperar que fique maior de idade para realizar o procedimento.
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